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Perus 'represados' e arroba do boi em baixa: reflexos da Carne Fraca em GO

Uma semana após a Operação Carne Fraca ser deflagrada, criadores e agropecuaristas de Goiás começam a contabilizar os prejuízos. O cenário no estado, conhecido por sua tradicional força econômica no campo, é de preocupação e incerteza. Dentre os reflexos da ação, que apura um esquema de fiscalização irregular nos frigoríficos brasileiros, estão a queda no preço do gado e a dificuldade em acondicionar 175 mil perus prontos para o abate, mas que permanecem "represados" nas granjas à espera de uma solução.

Nos pastos, essa conta já chegou. Segundo a Associação Goiana do Nelore (AGN), houve uma queda de 3% no valor da arroba, que corresponde a 15 kg. De acordo com o presidente, Eurico Velasco, na manhã da última sexta-feira (23), dia em que a operação aconteceu, o valor da arroba era de R$ 132. Quatro dias depois, o preço tinha caído para R$ 128.

O presidente explica que um boi, em média, pesa 20 arrobas. Assim, o reajuste do preço acarreta uma redução de R$ 80 no preço total, pois passa de R$ 2.640 mil para R$ 2.560 mil. Para os pecuaristas, a queda dá uma grande diferença no fim das contas.

“Estamos trabalhando com uma margem bem apertada de lucro. Agora, com menos esses R$ 80 vamos acumulando prejuízo porque temos funcionários, que tiveram aumento no salário, as despesas aumentaram. O valor de venda do bezerro vivo também teve queda”, declarou.

Velasco ressalta a qualidade da carne produzida. “Temos a melhor carne do mundo. O nelore tem a capa de gordura por fora. Então, tem o teor de colesterol bem menor que o gado europeu, que tem a gordura entremeada, por exemplo”, pontua.

Nova busca por estabilidade
De acordo com a assessora técnica da Federação da Agricultura e Pecuária de Goiás (Faeg), Christiane Rossi, o mercado de carne bovina em Goiás se mantinha estável até a deflagração da operação, que foi o estopim para a tendência de queda se confirmar.

"Esse índice não é muito preocupante. Já vínhamos com preços estáveis, mas com uma tendência de queda. Antes da operação, havia mais oferta de animais para o abate, mas o consumo estava reduzido pelo cenário econômico que já vinha fraco", destaca.

Com a situação, conforme a especialista, os frigoríficos não conseguiam dar vazão à carne. O estoque pode fazer com que o preço final ao consumidor diminua, uma vez que há mais oferta.

Nesse sentido, ela afirma que não notou a população comendo menos carne. "Pelo contrário. O que a gente percebe é que o brasileiro gosta e não fica sem carne. Houve queda no consumo de enlatados, mas de carne não", revela.

O que fazer com os perus?


Paralela à situação do gado, quem convive com a mesma crise - em um grau até maior - são os criadores de perus de Mineiros, na região sudoeste de Goiás. A planta da BRF, a única interditada em Goiás, é responsável por abater toda a produção, cerca de 25 mil aves por dia, o que não ocorre desde a última sexta-feira (17).

De acordo com o presidente da Associação dos Avicultores Integrados de Mineiros (Avip), Aloir Vicente da Silva, os animais são levados ao frigorífico somente até um determinado peso, caso contrário, não estão aptos e podem até morrer. A situação criou um impasse: o que fazer com 175 mil perus que estão à espera do abate?

"Estamos fazendo um vazio sanitário paliativo, mantendo o peru na granja o máximo que podemos esperando que essa situação se resolva. Mas se até na próxima segunda-feira (27) não tivermos uma posição, será um caos. A cadeia segue produzindo e não temos onde colocar as aves", desabafa.

A BRF já conseguiu, junto ao Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa) autorização para transferir seu abate diário de frangos (cerca de 115 mil unidades) para a planta da empresa que fica em Rio Verde. O mesmo pedido foi feito para levar os perus para Uberlândia, mas a resposta ainda não foi dada. Para Silva, a situação, se não resolveria o problema, ao menos o amenizaria.

'Bode expiatório'
A Avip é composta por 122 produtores e 219 granjas. Todas elas são interligadas com o frigorífico. O presidente conta que, no final do último mês de fevereiro, membros do Mapa estiveram na cidade e avaliaram toda a estrutura dos complexos, os quais foram "aprovados com louvor". Por conta disso, ele não consegue entender o que motivou a interdição pouco tempo depois e critica a medida.

"Nós fazemos tudo que prescreve as boas práticas de produção. Temos três certificados internacionais, avaliados pela comunidade europeia. Seguimos rigorosos controles de qualidade e estávamos no nosso melhor momento. As granjas e o frigorífico têm procedimentos e uma barreira sanitária. Não conseguimos entender a interdição. Mineiros está sendo um bode expiatório. Não são as aves que não tem qualidade, mas sim as pessoas", disse.

Carne Fraca
Dois frigoríficos de Goiás foram citados na Operação Carne Fraca: além do BRF de Mineiros, também consta o Primor Beef - JJZ Alimentos, de Goianira, na Região Metropolitana da capital. Este último, apesar da menção, segue funcionando.

Em nota, a BRF explicou que os 2.250 funcionários da fábrica de Mineiros terão seus salários pagos integralmente e todos os benefícios serão mantidos.
Já a assessoria de imprensa do frigorífico Primor Beef - JJZ disse que apenas o dono, Jorge Jonas Zabroks, falaria sobre a questão da produção. O G1 entrou em contato com ele, mas as ligações não foram atendidas.

Três plantas da JBS, em Goiânia, Senador Canedo e Mozarlândia, também estão interditadas. A situação faz parte de uma decisão da empresa que fechou, por três dias, 33 de suas 36 unidades no país. A empresa disse que o objetivo é ajustar a produção até que haja uma decisão sobre as restrições, adotadas por vários países, à importação de carne brasileira.

Em comunicado, a empresa ressaltou que "está empenhada na manutenção do emprego dos seus 125 mil colaboradores em todo o Brasil".

Carne podre
Fiscal do Mapa que denunciou o esquema, Daniel Gouveia Teixeira diz que os frigoríficos usavam cabeças de suínos e um produto químico conhecido como ácido ascórbico como um truque para “maquiar” a qualidade. “Ele é misturado na massa dos produtos para poder diminuir a infecção bacteriana e mascarar os odores e as características de carne podre”, afirmou.

O Mapa destacou, em nota, que o uso do ácido e de cabeça de suínos não é proibido, desde que estejam dentro das normas estabelecidas pelo ministério.

O Sindicato das Indústrias da Carne e Derivados do Estado de Goiás (Sindicarne) garante que, apesar das suspeitas de irregularidades na liberação de licenças e fiscalização irregular de frigoríficos, a carne produzida no estado é de boa qualidade.

“Como é que uma indústria vai produzir uma carne moída misturada com papelão? Qual a diferença do músculo da cabeça do porco com a paleta, ou do lombo? Todas são carnes e têm a mesma quantidade de proteínas. Posso dizer ao consumidor goiano que a carne de Goiás é de primeira qualidade, é a melhor produzida no Brasil”, destacou o presidente do Sindicarne, José Magno Pato.

Fonte: G1


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